Foi realizada na noite de ontem (11) no Museu de Arte da Bahia (MAB) a Reunião em Defesa dos Povos de Terreiro. No encontro, que contou com a presença de representantes de mais de 20 casas da Bahia e outros estados, membros do Movimento Negro e do diretor do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac), João Carlos Cruz de Oliveira, foi apresentada a ação movida pela Comissão de Preservação e Salvaguarda dos Terreiros Tombados contra o processo que, há 11 anos, tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) e tenta proibir o abate de animais em rituais religiosos de matrizes africanas.
Representante do Ilê Axé Opó Afonjá e membro da Comissão de Preservação e Salvaguarda, Osvaldo Pita disse que a assinatura desse documento é de grande importância para a afirmação das religiões afro-brasileiras. “É preciso combate o preconceito e defender os nossos mitos e ritos”, afirmou. Após ser assinado pelas lideranças religiosas, a ação será encaminhada à presidente do STF, a ministra Cármen Lúcia.
De acordo com o advogado Hedio Silva Júnior, que representa os terreiros, a crítica que se tem feito ao abate de animais em rituais das religiões de matrizes africanas se dá mais pelo racismo do que propriamente pela preocupação com o bem estar desses animais. “O número de cabeças de gado no Brasil é superior ao de brasileiros. Segundo o Ministério da Agricultura, o Brasil abate por segundo um boi, um porco e 180 frangos. Se o abate é comercial, não há problema, mas se o abate é religiso, sim”, afirmou Silva.
Em sua apresentação, o advogado explicou ainda que o abate religioso não é uma exclusividade do Candomblé. Judeus e muçulmanos também utilzam técnicas próprias das suas religiões para sacrificar animais para fins comerciais e litúrgicos, inclusive no Brasil, mas isso não tem sido objeto de crítica. “Um senhor judeu despacha uma galinha nove vezes sobre a cabeça, recita uma prece e entrega o animal para o abate”, explicou.
Ainda segundo Silva, a forma de abate realizada nos terreiros é considerada humanitária pela Declaração Universal dos Direitos dos Animais. “No método de abate feito por judeus, muçulmanos e pelas religiões afro-brasileiras, que é o método da degola, o animal leva dois segundos para atingir o estado de inconsciência, de maneira que a legislação europeia cataloga o abate religioso como uma das modalidades de abate humanitário, logo, está de acordo com a Declaração Universal dos Direitos dos Animais”, disse.
Segundo o diretor do Ipac João Carlos de Oliveira há o risco de constituir uma inconstitucionalidade caso seja aprovado pelo STF a proibição do abate de animais em cultos de matrizes afro. “Se existe uma Lei que permite a preservação do patrimônio cultural brasileiro e essa legislação está diretamente ligada à preservação do culto, não pode existir outra lei transversal que não permita que se pratique o próprio instrumento da preservação”, explicou.
Diante do impasse legal, Oliveira disse que no próximo dia 16 irá se reunir com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para que seja construída uma agenda política sobre o assunto. “Vamos construir nota técnica a partir do órgão estadual de patrimônio e a partir do órgão nacional de patrimônio no sentido de esclarecer ao Supremo Tribunal Federal o risco de se construir uma inconstitucionalidade”.
O diretor frisou ainda que há por parte dos órgão de patrimônio artístico a preocupação com o combate à intolerância religiosa. “É preciso saber que ao praticar preconceito religioso, se está praticando um crime”, afirmou.
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