Confira na íntegra, carta de Dilma em que propõe plebiscito sobre eleição e admite erros durante gestão


A presidente afastada, Dilma Rousseff, tornou pública nesta terça-feira (16), no Palácio da Alvorada, a carta construída por ela em conjunto com aliados políticos e correligionários. Batizada de “Mensagem ao Senado e ao povo brasileiro”, o texto aponta erros cometidos por ela na gestão do país e propõe a realização de um plebiscito para consultar o eleitorado sobre uma eventual antecipação das eleições presidenciais de 2018.dilma4

O manifesto de quatro páginas foi apresentado pela própria Dilma em uma entrevista coletiva realizada na residência oficial da Presidência da República. “Meu retorno poderá contribuir decisivamente para o surgimento de uma nova e promissora realidade política. Minha responsabilidade é grande. Na jornada para me defender do impeachment, me aproximei mais do povo, tive oprotunidade de ouvir seu reconhecimento, receber seu carinho. Ouvi críticas duras ao meu governo. Há erros cometidos e medidas políticas que não foram adotadas”, diz trecho da carta.

“Todos sabemos que há um impasse gerado pelo esgotamento do sistema político, seja pelo número excessivo de partidos, pelas práticas políticas questionáveis a exigir profunda transformação nas regras vigentes. Estou convencida da necessidade e darei apoio irrestrito à convocação de plebiscito para consultar a população sobre a realização antecipada de eleições, bem como sobre a reforma política e eleitoral”, escreveu a petista.

Confira a carta na íntegra:

MENSAGEM DA PRESIDENTA DA REPÚBLICA DILMA ROUSSEFF
AO SENADO FEDERAL E AO POVO BRASILEIRO

Brasília, 16 de agosto de 2016

Dirijo-me à população brasileira e às Senhoras Senadoras e aos Senhores
Senadores para manifestar mais uma vez meu compromisso com a democracia e com as
medidas necessárias à superação do impasse político que tantos prejuízos já causou ao
País.
Meu retorno à Presidência, por decisão do Senado Federal, significará a
afirmação do Estado Democrático de Direito e poderá contribuir decisivamente para o
surgimento de uma nova e promissora realidade política.
Minha responsabilidade é grande. Na jornada para me defender do
impeachment me aproximei mais do povo, tive oportunidade de ouvir seu reconhecimento,
de receber seu carinho. Ouvi também críticas duras ao meu governo, a erros que foram
cometidos e a medidas e políticas que não foram adotadas. Acolho essas críticas com
humildade e determinação para que possamos construir um novo caminho.
Precisamos fortalecer a democracia em nosso País e, para isto, será
necessário que o Senado encerre o processo de impeachment em curso, reconhecendo,
diante das provas irrefutáveis, que não houve crime de responsabilidade. Que eu sou
inocente.
No presidencialismo previsto em nossa Constituição, não basta a
desconfiança política para afastar um Presidente. Há que se configurar crime de
responsabilidade. E está claro que não houve tal crime.
Não é legítimo, como querem os meus acusadores, afastar o chefe de
Estado e de governo pelo “conjunto da obra”. Quem afasta o Presidente pelo “conjunto da
obra” é o povo e, só o povo, nas eleições.
Por isso, afirmamos que, se consumado o impeachment sem crime de
responsabilidade, teríamos um golpe de estado. O colégio eleitoral de 110 milhões de
eleitores seria substituído, sem a devida sustentação constitucional, por um colégio
eleitoral de 81 senadores. Seria um inequívoco golpe seguido de eleição indireta.
Ao invés disso, entendo que a solução para as crises política e econômica
que enfrentamos passa pelo voto popular em eleições diretas. A democracia é o único
caminho para a construção de um Pacto pela Unidade Nacional, o Desenvolvimento e a
Justiça Social. É o único caminho para sairmos da crise.
Por isso, a importância de assumirmos um claro compromisso com o
Plebiscito e pela Reforma Política.
Todos sabemos que há um impasse gerado pelo esgotamento do sistema
político, seja pelo número excessivo de partidos, seja pelas práticas políticas
questionáveis, a exigir uma profunda transformação nas regras vigentes.
Estou convencida da necessidade e darei meu apoio irrestrito à convocação
de um Plebiscito, com o objetivo de consultar a população sobre a realização antecipada
de eleições, bem como sobre a reforma política e eleitoral.
Devemos concentrar esforços para que seja realizada uma ampla e
profunda reforma política, estabelecendo um novo quadro institucional que supere a
fragmentação dos partidos, moralize o financiamento das campanhas eleitorais, fortaleça
a fidelidade partidária e dê mais poder aos eleitores.
A restauração plena da democracia requer que a população decida qual é o
melhor caminho para ampliar a governabilidade e aperfeiçoar o sistema político eleitoral
brasileiro.
Devemos construir, para tanto, um amplo Pacto Nacional, baseado em
eleições livres e diretas, que envolva todos os cidadãos e cidadãs brasileiros. Um Pacto
que fortaleça os valores do Estado Democrático de Direito, a soberania nacional, o
desenvolvimento econômico e as conquistas sociais.
Esse Pacto pela Unidade Nacional, o Desenvolvimento e a Justiça
Social permitirá a pacificação do País. O desarmamento dos espíritos e o arrefecimento
das paixões devem sobrepor-se a todo e qualquer sentimento de desunião.
A transição para esse novo momento democrático exige que seja aberto um
amplo diálogo entre todas as forças vivas da Nação Brasileira com a clara consciência de
que o que nos une é o Brasil.
Diálogo com o Congresso Nacional, para que, conjunta e responsavelmente,
busquemos as melhores soluções para os problemas enfrentados pelo País.
Diálogo com a sociedade e os movimentos sociais, para que as demandas
de nossa população sejam plenamente respondidas por políticas consistentes e eficazes.
As forças produtivas, empresários e trabalhadores, devem participar de forma ativa na
construção de propostas para a retomada do crescimento e para a elevação da
competitividade de nossa economia.
Reafirmo meu compromisso com o respeito integral à Constituição Cidadã
de 1988, com destaque aos direitos e garantias individuais e coletivos que nela estão
estabelecidos. Nosso lema persistirá sendo “nenhum direito a menos”.
As políticas sociais que transformaram a vida de nossa população,
assegurando oportunidades para todas as pessoas e valorizando a igualdade e a
diversidade deverão ser mantidas e renovadas. A riqueza e a força de nossa cultura
devem ser valorizadas como elemento fundador de nossa nacionalidade.
Gerar mais e melhores empregos, fortalecer a saúde pública, ampliar o
acesso e elevar a qualidade da educação, assegurar o direito à moradia e expandir a
mobilidade urbana são investimentos prioritários para o Brasil.
Todas as variáveis da economia e os instrumentos da política precisam ser
canalizados para o País voltar a crescer e gerar empregos.
Isso é necessário porque, desde o início do meu segundo mandato,
medidas, ações e reformas necessárias para o País enfrentar a grave crise econômica
foram bloqueadas e as chamadas pautas-bomba foram impostas, sob a lógica
irresponsável do “quanto pior, melhor”.
Houve um esforço obsessivo para desgastar o governo, pouco importando
os resultados danosos impostos à população. Podemos superar esse momento e, juntos,
buscar o crescimento econômico e a estabilidade, o fortalecimento da soberania nacional
e a defesa do pré-sal e de nossas riquezas naturais e minerárias.
É fundamental a continuidade da luta contra a corrupção. Este é um
compromisso inegociável. Não aceitaremos qualquer pacto em favor da impunidade
daqueles que, comprovadamente, e após o exercício pleno do contraditório e da ampla
defesa, tenham praticado ilícitos ou atos de improbidade.
Povo brasileiro, Senadoras e Senadores,
O Brasil vive um dos mais dramáticos momentos de sua história. Um
momento que requer coragem e clareza de propósitos de todos nós. Um momento que
não tolera omissões, enganos, ou falta de compromisso com o País.
Não devemos permitir que uma eventual ruptura da ordem democrática
baseada no impeachment sem crime de responsabilidade fragilize nossa democracia,
com o sacrifício dos direitos assegurados na Constituição de 1988. Unamos nossas forças
e propósitos na defesa da democracia, o lado certo da História.
Tenho orgulho de ser a primeira mulher eleita presidenta do Brasil. Tenho
orgulho de dizer que, nestes anos, exerci meu mandato de forma digna e honesta. Honrei
os votos que recebi. Em nome desses votos e em nome de todo o povo do meu País, vou
lutar com todos os instrumentos legais de que disponho para assegurar a democracia no
Brasil.
A essa altura todos sabem que não cometi crime de responsabilidade, que
não há razão legal para esse processo de impeachment, pois não há crime. Os atos que
pratiquei foram atos legais, atos necessários, atos de governo. Atos idênticos foram
executados pelos presidentes que me antecederam. Não era crime na época deles, e
também não é crime agora.
Jamais se encontrará na minha vida registro de desonestidade, covardia ou
traição. Ao contrário dos que deram início a este processo injusto e ilegal, não tenho
contas secretas no exterior, nunca desviei um único centavo do patrimônio público para
meu enriquecimento pessoal ou de terceiros e não recebi propina de ninguém.
Esse processo de impeachment é frágil, juridicamente inconsistente, um
processo injusto, desencadeado contra uma pessoa honesta e inocente. O que peço às
senadoras e aos senadores é que não se faça a injustiça de me condenar por um crime
que não cometi. Não existe injustiça mais devastadora do que condenar um inocente.
A vida me ensinou o sentido mais profundo da esperança. Resisti ao cárcere
e à tortura. Gostaria de não ter que resistir à fraude e à mais infame injustiça.
Minha esperança existe porque é também a esperança democrática do povo
brasileiro, que me elegeu duas vezes Presidenta. Quem deve decidir o futuro do País é o
nosso povo.
A democracia há de vencer
Dilma Rousseff

*Metro1